Força vs. Flexibilidade: Treinamento Concorrente ou Combinado?

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Força vs. Flexibilidade Treinamento concorrente ou combinado
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A flexibilidade e força em níveis adequados podem promover a melhora da qualidade de vida através da execução de movimentos mais eficientes, além de melhorias na realização das atividades diárias, na estabilidade postural, no equilíbrio, e no desempenho esportivo (ACSM, 2011).

Especificamente, a flexibilidade pode ser definida como a capacidade de mover uma articulação em sua amplitude de movimento completa e é considerada um importante componente da aptidão física relacionado a saúde e desempenho atlético (ACSM, 1998).

Fatores como o gênero, idade e condicionamento físico podem influenciar o seu desempenho.

Além destes, a prática regular de exercícios é mais um fator capaz de influenciar a flexibilidade e amplitude de movimento (Fleck e Simão, 2008).

Desta forma, a prescrição de exercícios físicos, entre estes o treinamento de força, pode apresentar como objetivo o desenvolvimento ou manutenção da flexibilidade.

Devido à amplitude de movimento estar relacionada a fatores morfológicos como músculos, tendões, ossos, articulações e tecido conjuntivo, é concebível que o treinamento de força tenha um efeito potencial na flexibilidade.

Entretanto, ainda existem controvérsias sobre os possíveis efeitos adversos que podem ser acarretados pelo treinamento de força sobre os níveis de flexibilidade.

Efeito da Musculação na Flexibilidade

Algumas pessoas (inclusive atletas) acreditam que, ao praticarem o treinamento de força, sofrerão encurtamento ou redução da flexibilidade.

Esse receio não encontra fundamento científico, pois, indivíduos altamente treinados, entre os quais levantadores olímpicos, têm flexibilidade normal ou até superior na maior parte das articulações do corpo (Fleck e Simão, 2008).

Na verdade, atualmente um número considerável de estudos sugere que o treinamento de força de forma isolada, realizado em amplitude normal, é capaz de aumentar significativamente a flexibilidade (Fleck e Kramer, 2017).

Estes estudos sugerem não ser necessário realizar exercícios de alongamento para que ganhos na flexibilidade ocorram na fase de adaptação inicial ao treinamento de força, principalmente se alguns comportamentos durante o treinamento de força forem adotados, como o uso de exercícios que contemplem a abrangência total dos movimentos, sem enfatizar excessivamente repetições com movimentos parciais e a inclusão de exercícios para os grupos musculares antagonistas e agonistas, de modo a trabalhar ambos os lados de todas as articulações principais (Barboza et al., 2002; Fatouros et al., 2006; Santos et al., 2009).

Apesar disso, com o avançar do tempo, em razão das modificações ocorridas nas estruturas que compõem os músculos, tendões e ligamentos, as respostas ao treinamento podem ser diferenciadas, e pode ocorrer a necessidade da inclusão de treinamento especifico de flexibilidade para obtenção de ganhos contínuos deste componente físico (Fleck e Simão, 2008).

Treinamento Concorrente ou Combinado?

A associação do treinamento de força ao treinamento de flexibilidade pode repercutir em aumentos contínuos da flexibilidade em diferentes populações, inclusive em indivíduos treinados.

De forma geral, a literatura que analisou os efeitos crônicos do treinamento combinado de força e flexibilidade sugere melhoras concomitantes destes dois componentes de aptidão física, entretanto estes resultados parecem depender da metodologia de treinamento empregada.

As características metodológicas da prescrição, como a ordem de execução dos protocolos de flexibilidade e força, intensidade, número de exercícios, séries e repetições, intervalos entre séries e sistema de treinamento também podem influenciar os resultados obtidos.

Efeitos na Flexibilidade

A magnitude das respostas da flexibilidade parece depender do tipo de alongamento e metodologia utilizada.

Como em todos os programas de treinamento, programas de alongamento devem ser prescritos de acordo com os objetivos e necessidade individuais.

Existem quatro tipos básicos de exercícios de alongamento:

  • Os movimentos lentos e contínuos,
  • O alongamento estático,
  • O alongamento balístico
  • A facilitação neuromuscular proprioceptiva (FNP)

 

Embora eles apresentem grandes diferenças metodológicas, a literatura sugere que não há diferença significativa entre os ganhos de flexibilidade decorrentes das diferentes técnicas (Fleck e Kraemer, 2017).

O papel do treinamento de flexibilidade ou alongamento sobre o aumento da flexibilidade ou melhora da amplitude de movimento de uma articulação ou série de articulações foi bem documentado na literatura (Fleck e Kraemer, 2017).

Entretanto, o que permanece controverso é se o alongamento pode oferecer algum efeito negativo na força se usado antes como parte do aquecimento para o treinamento de força, dado o potencial para um impacto negativo no desempenho de força.

Efeito concorrente do alongamento na força e hipertrofia?

Na verdade, nos últimos 10 anos o uso de técnicas como o alongamento estático e FNP como parte do aquecimento, imediatamente antes de treinos ou competições de força e potência, tem sido questionado.

Realmente, alguns estudos sugerem que a realização de exercícios de alongamento de alta intensidade antes da realização de testes de força ou potência parece resultar na queda do desempenho de forma aguda (Bacurau et al., 2009).

Apesar dessa redução no desempenho agudo, os estudos que analisaram os efeitos crônicos do treinamento combinado de flexibilidade e força, não apresentam prejuízos a longo prazo, muito pelo contrário (Nóbrega et al., 2005; Simão et al., 2011; Junior et al., 2017).

Simão et al. (2011) sugerem que o alongamento realizado antes do treino de musculação não produz efeitos negativos.

Neste estudo tanto o grupo que realizou apenas musculação quanto o grupo que realizou alongamentos antes dos treinos apresentaram ganhos em força após 16 semanas.

O grupo que realizou apenas musculação apresentou uma tendência a maiores ganhos do que o grupo que fez alongamentos antes musculação:

  • 71 vs. 57% para o legpress
  • 200 vs. 150% para o supino

 

Porém, notem que o alongamento não resultou em perda da força, muito pelo contrário.

Estes resultados sugerem que no treinamento focado na força máxima, alongamentos antes das sessões devem ser evitados, porém em um treino que tenha como objetivo o trabalho de diferentes valências físicas em uma mesma sessão (força, hipertrofia, flexibilidade, resistência), a realização de alongamentos antes da musculação não parece prejudicial.

No caso da maioria destes estudos, observa-se ganhos reduzidos em força e/ou hipertrofia para programas que combinam o treinamento de flexibilidade ao treinamento de força quando comparados a programas de treinamento de força realizados de forma isolada.

Apesar de apresentar ganhos menos expressivos, o treinamento combinado de força e flexibilidade resulta, na maioria dos estudos, em ganhos significativos da força, hipertrofia e/ou flexibilidade.

Aplicações Práticas

Desta forma, o treinamento de flexibilidade pode ser executado como aquecimento ou volta a calma em uma sessão combinada com treinamento de força ou treinamento cardiorrespiratório ou como uma sessão de treinamento isolada e separada.

Se o desempenho de força e potência é importante para o praticante, protocolos de treinamento que envolvam a realização de técnicas como o alongamento estático e o FNP devem ser evitadas, principalmente antes de atividades de força e potência.

Concluindo, a necessidade de treinar especificamente a flexibilidade pode variar entre as pessoas e esportes.

Avaliar movimentos e medidas de flexibilidade pode ajudar na elaboração de um programa de treinamento, pois a seleção adequada de movimentos e protocolos de treinamento pode fazer a diferença.

Referências

Belmiro Freitas de Salles

Belmiro Freitas de Salles

Pesquisador | Professor | Treinador

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